sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Fluxo

“o sagrado instinto de não ter teorias”
B. Soares


Às vezes acredito que o meu problema
são verdades absolutas que me assolam
momentos que vivi e senti de maneira tão intensa
que o leito confuso do rio de minha vida
abalou-se por inteiro,
eternamente.

Como se uma tempestade derramasse
sua chuva prazeirosamente
na serrana nascente
sabendo que a força ali depositada
iria, algum dia, inevitavelmente
(talvez até em uma tranquila praia tropical)
encontrar a imponderabilidade imensa do mar.

A Lua brilha
e por todas as coisas que me revelaram
algo de verdadeiro e saboroso
Sei que a vida é mais e pode mais

Sei que o que está contido
nos desencontros pelos quais me engano
é pouco perto do que se oferece
gratuitamente a todos aqueles
dispostos a estar de acordo
com aquilo que não é ilusão e desperdício

Tenho em meu peito a essa altura
uma dose (um tanto quanto histérica)
de resignação.

Sei que por aquilo que acredito e vivo
não posso esperar mais do “mundo”,
bem como da maioria das pessoas,
algo diferente de desprezo
e um pensamento disciplinadamente disposto
a me considerar simplesmente um vagabundo.

Como disse,
tenho uma consciência trágica
dessa nihilista reciprocidade:
De certa forma,
também não gosto do “mundo”
e se para eles
eu não passo de um vadio
(na melhor das hipóteses talentoso)
Eles para mim
são um bando de iludidos e desperdiçados
arrastando a miséria de suas horas

sem perceber que cada ser humano contém em si
o brilho de uma estrela
sem perceber que a cada conta a cada medo
ela se apaga
mais cedo

Não me importo sempre
com a minha arrogância.
Não posso
ser senão
a partir da paixão,
a qual me impulsiona
Rainha
mesmo nos momentos de desamor.

Por agora descansarei
na energia palavrosa de meus sonhos
Deixo o meu sim
e minhas melodias alegres de amanhecer
Para quando a madrugada tiver seduzido
as últimas trevas da noite.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

haikai da manhã no sol

Pássaros cantam

azul o céu nos cobre

Tudo Pelo sol

experimento do céu

A andorinha cruza
O frio ar de inverno

Sobre ela
imenso
E através de meus sonhos lúcidos
Uma nuvem púrpura sugerindo incenso
Cruza o claro azul
Infinito estendido sobre o dia

Lembro o que não sei
Distraído sobre o que
Esqueço em sintonia

Num mutante
momento do entardecer

a nuvem transmutou-se
em uma borboleta cinza

Que dissolvendo-se no amor
Celebra um naufrágio na maré do vento
onde o céu colore mais um experimento

mundomovente

Cheiros Gostosos
Ardidos como limão caipira
Confundiam-nos com suas cores agudas

Nossas vidas profundas
em múltiplos cenários
Sugeriam-nos mergulhos imaginários
em universos interagindo
em apenas um segundo



caiu

uma


folha

por mais um momento


nosso mundo em movimento


basta


uma





escolha

Prosa Celeste

" para vó orídia (harilda) "


Um lindo pôr do sol

colore a última despedida

Rosas vermelhas
embelezam a saudade

E no coração

agora envolvido e apertado
pelo mistério da perda


fica a certeza
de um amor de verdade


A lembrança
daquele abraço único
nos confortando
com o mais carinhoso
magrinho tapa nas costas


traz tal qual
um vento viajante

uma vontade de tomar chimarrão

e sentindo cheiro de feijão na cozinha antiga
ouvir causos e histórias

naquela prosa fantástica
que só as avós sabem tecer

Ah vozinha! Sua horta agora é de nuvens
e sua companhia seu filho menino
certamente os anjos
sentem-se hoje privilegiados
por poderem prosear com você
num desses fins de tarde celestiais

Em que o infinito
é calmo
como a vista do seu sítio
e óbvio
como tirar leite da vaca

Aprumo do rumo

Num dia
Vou compor
um soneto alexandrino
deixar de ser finalmente
um simples poeta menino

E no outro
vou buscar o charme
dos bêbados de Veneza
Quando meu lirismo está de Lua
meio maluco beleza

Zigue-Zague
Vaga-Lume
Luz Errante
Passo
e Vôo
Que não olha
para trás

Me perturba
Num instante
Um sonho Louco

viagem de palavras que se faz

em desequilíbrios vagantes
versos perturbam o rumo
de uma orquestra que busca seu prumo
no ritmo solto do mar

Pororóca Sonora

Mil borboletas
de asas grandes
e cores impossíveis
pousavam nos galhos secos

Suas vibrações
cíclicas como tudo o que existe
eram o movimento das folhas:
equilibristas do outono

captando o beleza do ar
se apaixonando
pelo vento do mar

Sinto
que viver
é estar de acordo

Nas ondas de tudo
Sinto um gosto nada

No fim da madrugada
Pode-se ainda testemunhar
o encontro da delicada
orquestra noturna

como o alegre
canto dos pássaros

Simplesmente
uma pororoca sonora
melodando o amanhecer